Escrever é um exercício de reflexão sobre a vida, enquanto se pode amar e manter o brilho no olhar!
Sobre
o Amor
Sempre esta inquietação sem
propósito, sem nexo, sem consequências,
Sempre,
sempre, sempre,
Esta angústia excessiva do espírito por coisa
nenhuma,
Na estrada de Sintra, ou na estrada do
sonho, ou na estrada da vida... (Álvaro
de Campos)
Acordo de manhã, coloco o café na chávena
(ou na xícara, se preferirem), e penso em ti. Na verdade, penso em ti ao longo
do dia e quando a noite se faz comprida e avança e pelo dia seguinte. Penso em
ti e em mim, assim, separadamente, pois não há como pensar em nós. Há muito que
os nossos caminhos se (des)cruzaram e que nos perdemos nos descaminhos da vida,
com continentes e mares de permeio. É muito longe. Melhor, são muitos os longes
de nossas vidas.
O bom do amor é que ele não conhece
fronteiras, nem precisa de reciprocidade para acontecer, como acreditam alguns.
O Amor é Amor! Que importa se o outro não corresponde? Amar é “ação”
individual, verbo transitivo que demanda objeto, voz passiva, que transforma o
objeto em sujeito passivo, dum agente que era sujeito. Por isso, o João que
amava Maria, que amava Carlos, que não amava ninguém (passe a paráfrase mal
parafraseada), é alguém que ama alguém, que ama um outro alguém, sem que se
cumpra o caminho da mutualidade. Se, por descuido do destino ela acontece, é a felicidade
suprema!
O amor é meu e, enquanto sujeito, dedico-o
a quem eu quiser, sem que isso torne o outro, o meu objeto de pertença. Ele é,
apenas, um sujeito passivo, a quem dedico o meu amor, daí poder dizer que o
outro é amado por mim. Quando digo que te amo, sou infinitamente verdadeira e o
meu amor é a verdade mais deliciosa da vida!
Sorris quando te declaro e entrego,
desprotegida e frágil, o meu amor, por não conseguires acreditar que haja,
nessa declaração, a verdade da essência do amor. Amo-te, porque te amo e não
tenho, nem espero, a contrapartida desse amor (seria bom!). Se correspondesses, aonde iria, amanhã, buscar o brilho no espanto no teu olhar? Apagar-se-ia a
chama? Amo-te e não te quero! Ter-te, seria perder-te, pois a posse mata o
amor. Alguns acreditam que ciúme é amor, mas não é. O ciúme vem da pertença.
Quando se diz: “Ele é meu! Ela é minha!”, sobrepõe-se a posse e mata-se a
liberdade de amar e ser amado, sem cobrança. É verdade que o amor quer
exclusividade e aí reside seu paradoxo. Quando te digo que te amo, gritando
baixinho, olhos nos olhos, dou-te um amor total que, sendo teu, me deixa (e te
deixa) livre para amar, quem mais o meu infinito amor quiser abrigar no peito.
Tu ainda não sabes, mas desconfias, já
descobriste – e te incomoda – que também me amas, para lá das palavras. Tu
sabes, e te assustas, com a urgência desse amor tardio que não pede o toque,
nem a cama, onde tudo se resolve e morre. Eu quero o amor perpétuo (muito além
da vida), como a gota de mar que caiu dos teus olhos e inundou minha alma!
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