J'éxiste
Quando consigo fazer-te sorrir
Quando pressinto que me olhas
com suavidade e ternura.
J'éxiste
Quando me conduzes
por sendas imprevisíveis.
Quando te debruças sobre uma flor
Para lhe desvendares o mistério!
J'éxiste
Quando consentes que minha mão
se entrelace na tua
J'éxiste quand je vois l'amour dans tes yeux
malgré les lèvres fermées.
J'éxiste parce que je t'aime!
Maio 2017
Espaço destinado a falar sobre poesia e arte; sobre velhice e qualidade de vida; sobre ensinar e aprender; temas de psicologia, literatura e sobre qualquer tema que mereça atenção e reflexão crítica.
24.10.18
21.6.18
O Pintassilgo e o Poeta
Caminho
a teu lado na rua apinhada de gente, falando línguas que não entendo. Caminho a
teu lado e vejo o que de longe me parece ser uma estranha e enorme pomba,
imóvel, pousada no muro que dá para o vazio. Não pode ser! É grande demais! Talvez uma gaivota estranhamente mansa, coçando as penas, indiferente aos
olhares humanos que a cercam. Olho de novo. Não, não é uma pomba, é uma gaivota
que, para espanto geral, se mantém naquele mirante, imóvel e indiferente a tudo e a
todos.
Sempre
achei que gaivotas fossem pássaros selvagens, ariscos, que se assustassem à menor
ameaça de aproximação dos humanos. Aquela, estava ali, parada, ao alcance da
mão, naquele velho muro debruçado sobre o Douro, coçando as penas, calma,
tranquila. Inacreditável! Mais adiante um gato, igualmente desinteressado dos
humanos, espoja-se na areia, espreguiça-se e corre em direção à gaivota, que o
ignora solenemente. Os turistas, máquinas em punho, desviavam o olhar do
casario que se precipita sobre o rio e apontavam as máquinas para o gato, para
a gaivota, enquanto tu fotografavas os turistas, fauna estranha a todo este
cenário e sorrias de toda esta loucura humana e do meu encantamento diante da
cidade amada, tantas vezes visitada e tão desconhecida!
Continuamos
a caminhada, nesse ou em outro dia qualquer. Andando, chegamos ao ponto exato
onde, alguns anos antes, observamos o rio “azulmente” escorrendo para o mar.
Outrora, o casario corroído pelo tempo, deixava vislumbrar restos de vida.
Então, “vi claramente visto” uma máquina de costura no alto de um telhado. Que
faria ela em tão inusitado lugar? Que faria, ali, no alto do telhado, uma
máquina de costura? Quem a teria colocado ali? Com que intenção? Não teria sido
apenas, a necessidade urgente de se livrar de um objeto útil, tornado inútil? Será que a costureira morreu e ninguém se interessou em seguir-lhe a profissão em tempos de prêt-à-porter? Curiosidade não satisfeita prosseguimos o caminho.
Percorremos
as margens do rio em busca de uma nova imagem de luz ou de sombras, de um lugar
para tomar uma água e refrescar a boca seca pelo calor de agosto (seria julho, ou setembro, que importa?) e subimos espremidos no funicular para continuar a
caminhada, perseguindo pichações eróticas, engraçadas, simbólicas, espalhadas
pela cidade. O dia foi de descobertas, desde a de um pisco pousado sobre a
cabeça do busto de António Nobre, pobre poeta sempre tão SÓ, agora visitado
pelos ladrões de cobre que lhe roubaram a identificação, as inscrições e cagado de
pássaros que poeticamente pousam sobre sua cabeça! Onde andará o verso capaz de
traduzir a imagem registrada na foto: “um pássaro pousado na cabeça do poeta”!
Quem
poderá descrever a poesia de um dia de sol, da visita furtiva de um ateu a meia
dúzia de igrejas, onde o silêncio, a paz e a arte barroca imperam? Vejo, na tua
falta de fé uma crença tão forte no belo, capaz de captar imagens que ninguém
mais vê. Dia cheio de imagens, de cores, de sons, de cheiros, de encontros e
desencontros, como no dia em que percorremos, juntos, outras ruas da cidade.
Pode ser que para o outro mundo eu possa
levar o que sonhei,
Mas poderei eu levar para o outro mundo
o que esqueci de sonhar?
(Álvaro de Campos)
Vejo,
para lá de outros elos que nos unem, um encontro silencioso de almas, como se
bastasse apenas um olhar, para que o diálogo, sem palavras, flua como um rio —
poderia ser o Douro — e se encontre no coração.
Nossos
caminhos são cheios de desencontros. Talvez por isso, eu ainda guarde a imagem
da infância, do ar altivo de lorde inglês, do alto dos teus seis anos de idade.
Adolescentes, o reencontro fugaz, se fez desencontro. Adultos, os encontros se
diluíram na poeira do tempo e da distância, entre Áfricas longínquas, tão diferentes quanto irreconhecíveis, inconciliáveis! (serão?). Assim, encobertos na densa bruma do D.
Sebastião, somos imagem esvaída de um álbum antigo de fotografias.
A
velhice pode ser surpreendente! Não sei por que se nega a velhice, se nela, tudo
pode acontecer... terreno onde as convenções deixaram de fazer sentido, e a
liberdade chega despudorada, despida de preconceitos... não para todos, claro,
mas para os que souberam viver sem medo, para os que conservaram um sorriso por
trás da cortina de lágrimas, para os que teimam em ver o sol espreitar por
entre densas nuvens.
Caminho
a teu lado na rua apinhada de gente, falando línguas que não entendo, enlaçamos
as mãos e nem mesmo assim tenho a certeza de que falamos a mesma língua.
Nossas sombras
20.5.18
Velejando a Vida
É difícil, ao velejador, recolher as
velas em meio à tempestade, mas é fundamental que o faça. Sem a calma e o
esforço necessários e suficientes ao desempenho da tarefa, o barco pode ficar à
deriva ou perder-se, definitivamente.
A vida é como o mar!
Em maré mansa, nós o contemplamos
extasiados, e gozamos o imenso prazer e a sensação de paz que nos vem da
vastidão das águas tranquilas. De repente, sem aviso prévio, arma-se a
tempestade e até o marinheiro mais experiente pode naufragar. O marujo com a
percepção mais aguçada, sente a mais leve virada do vento, um cheiro diferente
no ar, um arrepio sutil, segue sua intuição e recolhe as velas, diante da
perplexidade dos companheiros, que não conseguem entender seus motivos, mas a
tempestade chega, as velas estão recolhidas e a embarcação está salva, alguns
agradecem.
Assim a vida! Chega sem o manual de
navegação e decorre entre calmarias e tempestades violentas. Os mais atentos,
intuitivos (nem sempre os mais sábios), percebem antecipadamente os rumos que
se avizinham, recolhem ou içam as velas com rapidez e singram cautelosamente os
mares, ou se arrojam diante do perigo e vencem as altas ondas.
Só nos resta escolher que tipo de
marinheiro queremos ser!
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